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26 de Abril de 2024

Análise Jurídica da Medida Provisória nº 927

As mudanças trabalhistas editadas frente à pandemia de coronavírus.

Publicado por Anna Carolina Naylor
há 4 anos

Em meio à crise social e econômica causada pela pandemia do coronavírus (COVID-19), o Presidente da República, editou a Medida Provisória nº 927, dispondo sobre condições trabalhistas durante o estado de calamidade pública reconhecido no Decreto Legislativo nº 6. E, dessa forma, demonstrou sua preocupação com a economia enquanto negligencia a gravidade do problema e a saúde pública.

Tal Medida Provisória levantou questões polêmicas, como por exemplo, a suspensão do contrato de trabalho durante quatro meses. A reação foi tão imediata que o próprio Presidente revogou o artigo 18, da Medida Provisória, na tarde desta segunda-feira, dia 23 de março de 2020.

Então, resta saber o que é uma Medida Provisória? Qual é seu processo legislativo? E, quais são os pontos tratados na Medida Provisória, nº 927?

1. MEDIDA PROVISÓRIA

A Medida Provisória está prevista no artigo 62, da Constituição Federal de 88. Essa é um ato unipessoal do Presidente da República e tem como pressupostos a relevância e a urgência, sendo apreciada posteriormente pelo Poder Legislativo.

Ela está sujeita ao controle de constitucionalidade que poderá apreciar a matéria, os limites materiais e os pressupostos. No entanto, quanto a este último, a apreciação só ocorrerá quando houver flagrante desvio de funcionalidade ou abuso de poder, tendo em vista que cabe ao Presidente da República analisar a urgência e relevância da MP.

Limites Materiais: a nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral, direito penal, processual penal e processual civil, organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, planos plurais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, matéria de Lei Complementar, projeto de lei em fase de veto ou sanção pelo Presidente da República e detenção ou sequestros de bens de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro. Poderá discorrer sobre matéria tributária, desde que respeitado o princípio da anterioridade.

2. PROCESSO LEGISLATIVO DA MEDIDA PROVISÓRIA

O Presidente da República edita a Medida Provisória, começando a correr o prazo de 60 dias a contar da data de publicação, podendo ser prorrogado por mais 60 dias.

Dentro de 48 horas a Presidência da Mesa do Congresso Nacional deverá designar uma Comissão Mista para emitir o parecer. Essa comissão será composta de 12 integrantes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, mais 12 suplentes. Essa composição apresenta uma exceção quando for de matéria sobre crédito extraordinário de lei orçamentária anual que deverá seguir os moldes do artigo 166, § 1º, da Carta Magna.

Em 14 dias, a Comissão Mista deverá apresentar o parecer único discorrendo sobre os aspectos constitucionais, inclusive sobre os pressupostos, sobre o mérito e sobre a adequação financeira e orçamentária da Medida Provisória. Os aspectos contitucionais e a adequação financeira e orçamentária poderão ser analisados preliminarmente por maioria simples, podendo ser a MP arquivada. Porém, ainda que o arquivamento ocorra, o parecer deverá apreciar o mérito. O parecer da Comissão Mista não pode ser substituído por ato monocrático do relator Presidente da Câmara dos Deputados. Após, o parecer será encaminhado para a Câmara dos Deputados e, posteriormente, para o Senado Federal.

Se em 45 dias, não houver o encerramento das votações, entra-se em regime de urgência constitucional, sobrestando as demais votações. Encerrada as votações ter-se-á quatro cenários:

a) Aprovação da Medida Provisória: quando integral, passa a ter força de lei;

b) Aprovação com alterações: a Comissão Mista poderá apresentar as emendas parlamentares dentro de 6 dias, desde que haja pertinência temática (se não houver, o Presidente da Comissão Mista, poderá realizar indeferimento liminar). Nesse caso, ocorre um projeto de lei de conversão e projeto de decreto regulamentativo das relações jurídicas decorrentes;

c) Rejeição expressa: a MP perderá seus efeitos retroativamente e o Congresso Nacional deverá disciplinar no prazo de 60 dias as relações jurídicas. Será publicado no Diário Oficial da União o ato declaratório de rejeição da Medida Provisória e esta não poderá ser matéria de reedição. Caso isso ocorra, o Presidente da República estará cometendo um crime de responsabilidade por impedir o livre exercício do Poder Legislativo (artigo 167, § 3º, da Constituição Federal).

d) Rejeição Tácita: ocorrerá quando houver inércia do Congresso Nacional após o vencimento do prazo, prorrogável por igual período. Quanto a este último, será considerada a rejeição tácita como definitiva.

3. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927

A Medida Provisória editada no dia 22 de março de 2020, atende aos pressupostos de relevância e urgência tendo em vista a atual crise de pandemia pela COVID-19. Outrossim, atende também aos critérios de limites de materialidade. Mas, não é por isso que não poderá ser rejeitada ou editada pelo Congresso Nacional e/ou não poderá ocorrer controle de constitucionalidade. Da mesma maneira, não é por essa razão que deixará de causar controvérsias.

Em seu artigo , poderá haver celebração de acordo individual entre empregado e empregador com preponderâncias aos “demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.” Tal possibilidade foi justificada para a manutenção do vínculo empregatício. Mas, em verdade, isso significa que pode haver acordo celebrado entre empregado e empregador sem a proteção sindical, da CLT ou de acordos coletivos, violando o princípio da proteção, na medida em que deixa o empregado ainda mais vulnerável nessa relação jurídica.

A MP, nº 927, possibilita aos empregadores tomar as seguintes medidas: teletrabalho, antecipação de férias individuais, concessão de férias coletivas, aproveitamento e antecipação de feriado, banco de horas, suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho, direcionamento do trabalhador para qualificação e diferimento do recolhimento do FGTS.

Entre essas medidas, podemos citar:

a) Férias: o empregador poderá conceder férias individuais ou coletivas, devendo notificar o (s) empregado (s) no prazo de 48 horas, sendo que nesta última não serão aplicáveis os limites previstos na CLT e fica dispensada a comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos. No caso das férias indiviuais, o pagamento do adicional de férias poderá ser realizado após sua concessão até a data da gratificação natalina. E, o pagamento da remuneração das férias poderá ser efetuado até o 5º dia útil do mês diferentemente do prazo de 2 dias antes do gozo das férias disposto no artigo 145, da CLT.

b) Banco de horas: poderá haver interrupção das atividades por parte do empregador, sendo que a compensação da jornada poderá ser estabelecida por meio de acordo coletivo ou individual formal. As horas serão compensadas da seguinte maneira: prorroga-se a jornada em até duas horas, não podendo exceder dez horas diárias. A compensação poderá ser determinada pelo “empregador, independentemente de convenção coletiva ou acordo invidual ou coleitivo”.

c) FGTS: a exigibilidade de recolhimento do FGTS de maço, abril e maio de 2020, ficam suspensas, podendo seu recolhimento ser realizado de forma parcelada, sem incidência de atualização, multas ou encargos, ficando o empregador obrigado a declarar informações até 20 de junho de 2020. A medida poderá ser adotada independentemente do número de empregados, regime de tributação, natureza jurídica, ramo de atividade econômica e adesão prévia.

Entre as disposições finais cabe citar que, durante o período de 180 dias, ficam suspensos os prazos para apresentação de defesa e recurso no âmbito de processos administrativos originários de autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS.

Outrossim, os Auditores Fiscais atuarão de maneira orientadora durante 180 dias, atuando normalmente quando: houver falta de registro de empregado (a partir de denúncia), situação de grave e iminente risco e ocorrência de acidente de trabalho fatal, somente quanto às irregularidades imediatas, e trabalho análogo a escravo ou infantil.

Analisando o que foi exposto fica evidente que a Medida Provisória tem como escopo auxiliar o empregador e “manter” a economia. No entanto, para isso, ela pode esbarrar nos princípios da proteção, da inalterabilidade contratual lesiva e da irrenunciabilidade de direitos, deixando a vulnerabilidade do empregado ainda maior e aumentando o desequilíbrio na relação trabalhista.

Agora, resta apenas aguardar a apreciação do Congresso Nacional. Atualmente, a MP está aguardando a designação dos membros da Comissão Mista, sendo a opinião pública majoritariamente contrária à MP.

LINKS DE ACESSO:

Medida Provisória 927: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm

Acompanhamento do Processo Legislativo: https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/mpv/141145

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